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domingo, 29 de julho de 2018

ELEIÇÕES 2018

Os convencionais de Bolsonaro

Em alguns momentos, a convenção que selou a candidatura do deputado parecia um culto de uma grande igreja evangélica

Delegados com direito a voto havia apenas 96 no domingo em que o PSL selou a candidatura de Bolsonaro a presidente da República. Mas o salão de convenções onde ocorreu o ato estava lotado. A organização estimou em três mil o número de presentes. Parece justo. Se não foi isso, estava muito próximo disso. Eram três mil pessoas iguais, ou quase iguais, ou muito parecidas umas com as outras. Eram unha e carne. Farinha do mesmo saco.
O salão foi dividido em duas partes. Na frente, no cercadão VIP, umas mil pessoas tinham visão privilegiada do palco. Atrás, outras duas mil pessoas, iguaizinhas às da frente, muitas vezes precisaram ficar em pé para avistar o candidato que estava sendo lançado. Eram na maioria homens, nas duas partes do salão, mas havia também mulheres e crianças. Mesmo estas, se observadas atentamente, se pareciam com aqueles.
Difícil falar em classe social num grupo tão grande. Mas acho que dá para identificá-lo através de algumas claras opções feitas pela maioria. Na religião, por exemplo, todos são cristãos. Não importa a denominação religiosa, todos acreditam em Deus e estão quase todos certos de que se tudo der errado ainda terão Deus para lhes salvar. Por isso o lema “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.
Em alguns momentos, a convenção parecia um culto de uma grande igreja evangélica. Até a sacolinha rodou ao final do ato atendendo a pedido do mestre de cerimônias da convenção. O apelo não foi religioso, mas foi demagógico. O líder falou que o PSL não aceitava doações de empresas, para não repetir tudo o que já se viu neste quesito, por isso a contribuição dos irmãos, digo, dos presentes, seria muito bem-vinda. Não esperei para ver quem se coçou.
Em outros momentos, a sensação era de que se estava dentro de um quartel. Na hora do Hino Nacional que abriu os trabalhos, muitos homens se colocaram em posição de sentido, as mãos espalmadas grudadas nas pernas, o rosto ereto, o queixo elevado. Nem um músculo fora do lugar. Apenas as carótidas se moviam enquanto cantavam, quase gritando, o hino à pátria. Estes formavam o grupo dos vibradores.
Eram eles também os mais tensos e excitados. Muitas vezes agressivos, não conseguiam esconder seu amor à ordem unida. Quando o deputado major PM Olímpio foi chamado a falar, um deles gritou bem alto para não ter dúvida de que seria ouvido: “Manda bala!”. Ex-instrutor de tiro, Olímpio não mandou nada. Nem de seu discurso saiu qualquer coisa que merecesse destaque. Quando um dos filhos do Bolsonaro mencionou o coronel torturador em seu discurso, esta plateia de desfile militar, em coro, gritou e repetiu: “Uhu, Uhu, Ustra!”.
O Bolsonaro filho, aliás, mencionou o torturador sem qualquer expressão de emoção. Certamente não pensou um segundo sequer nos que se confrontaram com Ustra amarrados a uma cadeira ou pendurados num pau de arara. Mas chorou quando citou o capitão reformado Jorge Rodrigues, ex-chefe de gabinete do pai que morreu de infarto em abril passado.
Coesos, bastava um puxar a palavra de ordem, não importa qual, todos seguiam em coro. A imprensa, que ocupou um cercado no centro do salão, foi bem xingada. Mas bastava qualquer um se interpor entre o palco e as câmeras de TV e jornais para o mestre de cerimônia pedir para que se sentasse de modo a não impedir que as imagens da cerimônia continuassem sendo feitas.
Alguns discursos a massa entendeu perfeitamente. O de Magno Malta, óbvio demais até para aquela plateia, foi ovacionado. Mas o de Janaína Paschoal aparentemente não foi bem entendido. Quando ela disse ser muito hobbesiana, em referência ao filósofo e matemático inglês do século XVI Thomas Hobbes, uma ouvinte comentou com a outra: “Que isso? Bobagem. Ela está ótima, magrinha”.

Ascânio Seleme – O Globo

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