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segunda-feira, 21 de outubro de 2019

CONTA BANCÁRIA

Os novos rumos de quem não tem conta em banco

Número de desbancarizados cresce no BrasilFoto: Léo Malafaia/Folha de Pernambuco


Se engana quem pensa que o uso de dinheiro em espécie está em queda. Hoje, R$ 820 bilhões já são movimentados por pessoas que preferem receber os valores em mãos, comprar fiado e negociar descontos em vez de ter uma conta em banco

No Brasil, 45 milhões de pessoas não possuem conta em bancos e movimentam R$ 820 bilhões com dinheiro em espécie, segundo pesquisa do Instituto Locomotiva. De acordo com o recorte, essas pessoas são habituadas a receber o dinheiro em mãos, comprar fiado e negociar descontos, representando uma fatia da população que olha os bancos como lugares inacessíveis.

Gente como a doméstica Maria José de Oliveira, que por não ter uma conta bancária, recebe em dinheiro e assim movimenta o que ganha. Para ela, ter banco não condiz com sua realidade financeira. “Eu sou uma pessoa muito humilde e devido a isso, se eu for ter conta em algum banco eu não vou poder juntar muito dinheiro para comprar algo que eu precise. O dinheiro em espécie me ajuda a movimentar melhor o que recebo”, revela dona Maria. Ela afirma, contudo, que nem sempre foi assim. “As vezes ter uma conta pode até ser melhor, para fazer uma poupança. Uma vez eu tentei, mas desisti, pois me senti muito mais confortável recebendo em espécie”, disse Maria.

De acordo com o presidente do Instituto Locomotiva, Ricardo Meirelles, quem prefere pagar em dinheiro tem menos necessidade de ser bancarizado. “Nossa pesquisa mostra que 29% dos desbancarizados dizem que não ter conta em banco porque preferem usar dinheiro em espécie. Essa preferência se explica principalmente por dois fatores: a possibilidade de barganhar descontos e o fato de que, com dinheiro vivo, fica mais fácil controlar os gastos do mês, porque as pessoas saem de casa com tudo contado”, explica Meirelles.


No entanto, ele admite que outros fatores ajudam a explicar o comportamento. “Por exemplo, muitos desbancarizados dizem não ter conta bancária por não ter dinheiro suficiente para movimentar ou por problemas passados com os serviços bancários. Isso se revela no fato de que 28 milhões de desbancarizados (62%) sequer têm intenção de abrir uma conta bancária no futuro”, completa o especialista.

Na visão do consultor econômico-financeiro, Tiago Monteiro, além da preferência por movimentar o dinheiro em espécie, entre os desbancarizados estão os que já possuíram conta bancária, mas deixaram o serviço. “As pessoas que já têm um conhecimento de bancos e quando saem optam pela desbancarização, fazem um movimento para as fintechs, instituições onde o dinheiro não é cobrado, ou se transferir para os bancos de investimentos, porque a população entende que o banco tradicional é caro”, conta Tiago.
  
O consultor coloca a dificuldade no acesso ao crédito como uma grande desvantagem de não ser cliente de um banco tradicional. “O lado negativo é que as pessoas sem conta em banco que não estão inseridas no mercado formal, não têm crédito por não ter movimentação, eles precisam juntar uma quantidade grande de dinheiro em um lapso de tempo grande para comprar algo mais caro”, atesta Monteiro.

Os desbancarizados são uma "tendência" maior no Brasil, pois além das questões sociais, o crescimento dos trabalhos informais e o desemprego dos últimos anos jogou essa fatia da população contra a evolução da bancarização. Afinal, R$ 812 bilhões em jogo é muito dinheiro para deixar embaixo do colchão. “Esse valor representa o PIB de Portugal, o que significa uma grande oportunidade para as instituições financeiras, mas também um grande desafio. Para conquistar esse mercado, bancos e fintechs precisam se aproximar dessas pessoas, conhecê-las a fundo e entender suas dores. Para chegar nessas pessoas, o sistema bancário deve ouvir e entender suas demandas e desenvolver produtos e serviços financeiros alinhados com suas necessidades e que destaquem benefícios em sua comunicação", revela Meirelles.

Pagamento instantâneo é opção do setor

O processo de inclusão financeira da população desbancarizada com a implantação do pagamento instantâneo, em novembro de 2020, inicializado por meio de um smartphone, já começa a revolucionar o mercado dos bancos e fintechs. Afinal, ninguém quer ficar atrás na preferência do cliente.

A Federação Brasileira de Bancos (Febrabran) acredita que as novas medidas vão reduzir a necessidade de circulação de dinheiro em espécie, assim como proporcionar mais segurança e conveniência ao consumidor. "Com o sistema nacional de pagamento instantâneo, será possível enviar e receber dinheiro durante 24 horas por dia, 7 dias por semana, e a meta dos bancos é fazer com que as transações eletrônicas ocorram em até 10 segundos".

As instituições financeiras já se preparam para aderir ao sistema. Entre os bancos estatais, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica afirmam estarem “atentos às mudanças nos meios de pagamentos, e dentre elas, a implementação do ecossistema de pagamento instantâneos no Brasil".

No meio privado, o diretor-presidente da Rede, empresa de meios de pagamentos do Itaú Unibanco, Marcos Magalhães, diz que a novidade vai além da inclusão financeira e da formalização da economia.

“Trata-se de um degrau mais alto alcançado na evolução do mercado. E também um reforço para o trabalho feito pela indústria de meios de pagamentos no desenvolvimento de recursos mais modernos que possam, entre outras finalidades, diminuir o uso do dinheiro espécie e, por consequência, aumentar a eficiência do pequeno comércio, que ainda assume riscos desnecessários no manuseio, transporte e acúmulo das cédulas”, diz Magalhães.

Mudança de hábito
O economista Tiago Monteiro destaca o tempo para que as pessoas se acostumem com o novo. "Ainda hoje se utiliza cheque e saca dinheiro para fazer o pagamento na lotérica por falta de confiança no pagamento on-line. Contudo, nos próximos dez anos a população brasileira aos trancos e barrancos vai se acostumar com a virtualização dos bancos, desburocratização das transações e ter outra forma de se comunicar em termos de dinheiro”, prevê Monteiro.

Fintechs investem na população sem contaMas se pagar em dinheiro não é necessariamente um problema para esses consumidores, como mostrar as vantagens da bancarização para quem convive bem com o pagamento em dinheiro? Como criar benefícios que sejam atrativos para essas pessoas? A resposta é simples, zerar as taxas. É justamente por isso que as fintechs têm causado uma grande revolução no sistema financeiro brasileiro. Segundo a Associação Brasileira de Fintechs, em 2016, não se tinha uma centena de fintechs no Brasil. Hoje, o número já passa de 600 dessas startups financeiras.

“As fintechs oferecem segurança e experiências diferenciadas aos clientes e tecnologia de ponta para instituições financeiras otimizarem sua capacidade operacional. Por atuarem em nichos específicos, de forma segmentada, conseguem oferecer alta performance por custos reduzidos", ressalta Rodrigo Soeiro, presidente da Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs).
Na NuBank, por exemplo, a não cobrança de taxas faz com que a carteira de clientes cresça em um ritmo acelerado que chega a inclusão de 50 mil novos clientes por dia. “Em dezembro do ano passado, tínhamos 5 milhões de clientes. Hoje, temos 15 milhões. Não cobramos qualquer taxa de manutenção. A gratuidade permite que, desde 2014, os usuários já tenham economizado R$ 2,2 bilhões em tarifas e anuidade e R$ 2 bilhões com taxas e TEDs desde o fim de 2017”, afirma a empresa.

O CEO da Matera, Carlo Netto, empresa de tecnologia para o mercado financeiro, explica que a disseminação das fintechs se deu após 2013, quando o Banco Central criou os arranjos de pagamentos. “O BC tirou dos bancos o monopólio da conta corrente, permitindo que mais empresas pudessem oferecer o serviço, proporcionando a disseminação das fintechs”, diz o especialista. Contudo, só isso não é bastante para ampliar tanto o número de clientes quanto no universo de fintechs. “Atualmente, as contas de fintechs terminam sendo restritas. A pessoa recebe nessa conta, mas quando o dinheiro chega nela, ela não consegue movimentar com liberdade”, explica Netto. Para sanar esse problema, o Banco Central trabalha numa solução em vigor a partir do próximo ano - o pagamento instantâneo. “Os pagamentos instantâneos vão ocorrer diretamente da conta do usuário pagador para a conta do usuário recebedor, sem a necessidade de intermediários, o que propiciará custos de transação menores. Ou seja, tanto o pagador quanto o recebedor devem ter algum tipo de conta transacional (conta de depósito à vista - conhecida como conta corrente -, conta de poupança ou conta de pagamento)”, explica o BC.

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