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quinta-feira, 15 de setembro de 2022

HOMOFOBIA NA ARBITRAGEM EM PERNAMBUCO

Bandeirinha pernambucano questiona ausência em escalações apesar de bom rendimento; suposto caso de homofobia é levantado

John alcançou, de forma recorrente, quatro das cinco estrelas disponíveis para avaliação (Foto: Reprodução/Premiere)


"Às vezes eu almoço a sopa da janta do dia anterior", desabafou John, que vem enfrentando dificuldades para se manter, sem espaço nas escalas de arbitragem


Bons deslocamentos. Aceleração. Boa técnica de uso da bandeira. Atuação muito boa. Cuidado com a partida. Boa postura. Prontidão física louvável. Atento. Concentrado.

Esses são alguns dos elogios que o árbitro assistente da Federação Pernambucana de Futebol (FPF) e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), John Andson Alves Ribeiro, de 33 anos, recebeu em relatórios de desempenho depois de atuar como bandeirinha nos seus cinco primeiros jogos profissionais. Todos pela Série B do Campeonato Brasileiro de 2020. Ele, inclusive, é avaliado recorrentemente com quatro das cinco estrelas em parecer técnico. 
 
Além desses jogos, ele atuou também raras vezes na Série C daquela mesma temporada, tendo sido escalado para menos de cinco partidas. Um ano depois, em 2021, fez dois jogos pela Série D e continuou na quarta divisão para este ano, tendo atuado em apenas três.

O “rebaixamento” nas oportunidades de atuação, assim como a diminuição do seu nome nas escalas para as partidas, são vistas como uma forma de discriminação por ele, que é gay e revelou que vinha sofrendo preconceito por isso. Inclusive, por um ex-integrante da Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol (CEAF).

O caso se tornou público nesta segunda-feira (13), quando John revelou detalhes dos acontecimentos em entrevista à Rádio Jornal. Na ocasião, ele foi um dos convidados para um programa em alusão ao Dia do Árbitro, comemorado em 11 de setembro. Ao ser perguntado sobre rotina, desafios e dificuldades, externou pela primeira vez sobre ser vítima de homofobia.

“Eu estou há dois anos sem fazer nenhum jogo, tanto da Série B quanto da Série C. Em 2021 e 2022, me ‘jogaram’ para a Série D, e sem motivo algum. Segundo todos os relatórios dos analistas, tenho um excelente desempenho. Em um desses documentos diz que não tenho ‘nada a melhorar’. E se não tenho nada a melhorar, por quê a exclusão por parte da CBF? Essa pergunta eles terão que responder”, questionou.

Perseguição

Um dos acontecimentos que fizeram John começar a se ver como vítima de preconceito por conta da sua orientação sexual veio através do “aviso” de um ex-membro da Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol (CEAF). Na ocasião, ele teria dito para o bandeirinha evitar fazer postagens nas suas redes sociais com o seu então companheiro. Naquele período, John era casado há seis anos.

“Evite postar nas redes sociais fotos que possam te comprometer”, relembrou o bandeirinha, que garantiu que o mesmo tipo de sinalização não era feita aos árbitros de orientação sexual diferente da sua.

Calúnia e difamação

Dois crimes contra a honra, a calúnia e a difamação também fizeram parte do dia a dia de John. Segundo ele, um colega de profissão inventou a história de que ele teria tido relações sexuais com um terceiro colega, também do quadro de arbitragem. A história se espalhou rapidamente no grupo e causou mal-estar em John, que descobriu enquanto se preparava para trabalhar em um jogo.

Segundo ele, a CEAF foi informada do acontecido, mas até o momento, nada foi feito.
 
“No dia em que eu ouvi essa história, estava faltando meia hora para começar um jogo em Caruaru. Eu tive que pedir para que parassem de falar aquilo, porque eu me senti incomodado com a situação. Todos os árbitros sabiam disso, se espalhou… mas eu não. Me afetou psicologicamente e eu, então, procurei a comissão. Agora, depois de sete ou oito meses, não resolveram nada”, disse.

À época, um pedido de desculpas chegou a ser feito através de um aplicativo de mensagens, conforme mostram as imagens a seguir.
À época, John recebeu um pedido de desculpas através de mensagens (Foto: Reprodução/Whatsapp)


À época, John recebeu um pedido de desculpas através de mensagens (Foto: Reprodução/Whatsapp)


 Sobrevivência

Apesar de formado como bacharel nos cursos de educação física e administração, e atualmente estudar farmácia, é da arbitragem que John tira a sua principal renda. Ou tirava.

Por receber pagamento apenas por jogo trabalhado, a diminuição do seu nome nas escalas também afetou diretamente a renda e a sobrevivência dele.

“Às vezes eu almoço a sopa da janta do dia anterior. A arbitragem é a minha única renda, e nós recebemos por jogo. Eu só recebo dinheiro quando sou escalado pela Federação Pernambucana de Futebol e com essa atual comissão, não venho tendo oportunidades. Mas também, como esperar sair na escala de uma comissão onde o próprio membro diz tamanha atrocidade?”, questiona, rememorando parte da sua história.

(Ainda) aguardando respostas

O bandeirinha John garantiu que deixou o atual presidente da Federação Pernambucana de Futebol (FPF), Evandro Carvalho, ciente do que estava se passando, e ouviu como resposta a promessa de que providências seriam tomadas, tanto a nível local como nacional. “Eu levei até Evandro Carvalho em fevereiro ou março, e o mesmo ficou de tomar uma atitude em relação aos seus funcionários da comissão e também de tomar providências a nível nacional com a CBF. Já passaram seis meses e nada de efetivo foi realizado”, alegou.

O que diz a FPF


Evandro, por sua vez, disse que não recebeu as queixas de maneira oficial, mas que chegou a se reunir com John e a responsável pela FPF Social, Déborah Gayo, a fim de combater algumas posturas dos profissionais do quadro de arbitragem.

Evandro Carvalho, atual presidente da Federação Pernambucana de Futebol (Foto: DP Foto)


“Eu falei com a comissão e pedi para terem cuidado com as coisas que possam ser interpretadas como hostis. Na comissão tem pessoas mais rústicas e tem que ter uma nova postura. Oficialmente, não recebi nada. Ele (John) perguntou se poderia fazer uma visita e então eu me reuni com ele e a Déborah para saber o que poderia ser feito para que ele se sentisse mais confortável. Eu direcionei para a diretoria específica”, disse o presidente, que prometeu reforçar a causa com a diretora. “Vou ligar para Déborah e pedir para que ela veja isso, se pode ser feito algo a mais”, enfatizou.
 
Evandro aproveitou a oportunidade para sinalizar que pediu à Confederação Brasileira de Futebol que mais árbitros locais fossem inseridos nas escalas e também elogiou John.

“Mandamos um ofício para a comissão nacional solicitando mais espaço para os nossos árbitros, de uma forma geral. E a comissão disse que ia atender”, afirmou.

“Ele (John) é bom e é novo. Tem um futuro muito grande e pode ser mais um FIFA nosso”, projetou.

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