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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

MÚSICA LOCAL SUFOCADA

Governo do Estado e prefeituras pernambucanas sufocam a música local


Os governantes estaduais e municipais, em sua maioria, sempre foram péssimos em construir uma política cultural para a música produzida por aqui. Mesmo assim, algumas gestões mais antigas conseguiram fortalecer as carreiras de alguns artistas.

Podemos elencar alguns nomes: Lenine, Alceu Valença, Almir Rouche, André Rio, Maracatu Nação Pernambuco, Spok, Mestre Salu, Selma do Coco e Chico Science.

Todos esses artistas foram contratados e apoiados em diversos projetos e, com seus talentos, ganharam o mundo. É bom tornar nítido que os artistas negros listados acima nunca tiveram o mesmo privilégio que os brancos.

Em 2022, o Movimento Mangue completou 30 anos. Porém, de 20 anos para cá, o que temos visto é um processo de sufocamento da música pernambucana, que, para se recuperar novamente, vai precisar de muito trabalho.

Aqui, vou focar apenas na música, pois a cultura popular será tema de outras letras que escreverei em breve.O sufocamento vem sendo imposto há muitos anos, mas neste Carnaval foi exacerbado de tal forma que merece uma reflexão durante todo o ano, para ver se a sociedade e o setor musical conseguem frear esse processo.

Primeiro, é importante perceber que a máquina pública está viciada e que esse vício contaminou o público.Como pensar um Carnaval, e todos os eventos que acontecem ao longo do ano, sem colocar na grade da programação, como destaque, atrações de peso nacional, se hoje temos poucos artistas pernambucanos com esse peso midiático?

A escassez é consequência do modelo de importação de artistas vindos de fora. Os gestores criadores desse modelo não sabem sair dessa, e nem tem o mínimo interesse em criar as soluções.

Para eles, o que importa é a Praça do Marco Zero em Recife, a Praça do Carmo em Olinda, as ruas do centro de Bezerros, o pátio do forró em Caruaru, a esplanada Dominguinhos em Garanhuns sempre lotadas.

Foi esse conceito que fortaleceu tais gestores e conquistou grande parte da sociedade pernambucana. Mas, como os artistas pernambucanos vão encher a praça sem investimento?

Acontece que o processo está no topo da pirâmide e também na base. E a sociedade não sabe disso, não quer saber e o que faz ela sair de casa são os artistas que estão na mídia.No topo da pirâmide, os artistas da mídia recebem um investimento grandioso dos cofres pernambucanos e, com esse investimento, eles bombam em suas redes sociais, sua música toca a partir do sudeste e a roda da fortuna gira.

A quantidade de shows que os artistas com escritórios no Rio de Janeiro e São Paulo vendem ao poder público pernambucano(municípios e governo do estado) é impressionante.

Tem artistas que chegam a vender dezenas de shows por ano. Detalhe: o primeiro show é um valor e o último, em alguns casos, chega a ser o dobro.

Na base da pirâmide, os artistas pernambucanos sofrem com uma escassez de venda de shows ao poder público, com produções cada vez mais sucateadas, festivais locais capengas, cachês congelados e sem estrutura para fomentar sua música nas redes digitais.

Os cachês dos artistas pernambucanos, que vivem em Pernambuco, são muito baixos.Os gestores públicos são cúmplices das armadilhas do mercado das culturas de massa, sufocaram um processo virtuoso que era embrionário e trouxeram o público para o lado deles, para legitimar toda essa desestruturação da cadeia produtiva da música pernambucana.

O Edital da Música do Funcultura, que parecia ser uma esperança, se transformou numa espécie de manteiga no focinho do gato.Lendo as reclamações dos artistas, percebe-se a angústia de quem está lutando contra um inimigo meio fantasma ou fulanizações sem consequências.

Será preciso começar do zero, com uma política de valorização dos cachês; patrocínio direto relevante a, pelo menos, 30 festivais pernambucanos consolidados; mudança e transparência nos editais, principalmente, do Carnaval e do São João, pois os prefeitos, deputados e secretários que nada entendem da cadeia produtiva da música não podem mandar nas programações; patrocínio para turnês nacionais e internacionais permanentes; inserção dos artistas e bandas nos principais horários e palcos do Carnaval e do São João; fortalecimento do Porto Musical com investimento do governo do estado e das prefeituras, para possibilitar um aquecimento na venda de nossos artistas nos mercados nacionais e internacionais; e maior investimento no Edital do Funcultura da Música.

Esses recursos serão provenientes do pagamento exorbitante dos cachês de artistas e bandas de outros estados, começando com um corte de pelo menos quarenta por cento.Sem uma mudança nesses parâmetros, vamos continuar assistindo a nossa música vegetando no leito da UTI, pois estamos vendo um processo que teve início em algumas prefeituras do interior, se alastrou pelo estado, chegou nos Palácios do Governo, Olinda e Recife, aportou na Rua da Aurora e teve seu alicerce estruturado nos escritórios do Centro de Convenções.

Por Afonso Oliveira*

*Produtor Cultural e Consultor de Políticas Culturais

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